Foi interessante a entrevista do pastor
Silas Malafaia concedida à Marília Gabriela. De sangue frio, Marília
cutuca um ponto delicado das religiões cristãs, que utilizam a Teologia
da Prosperidade para se alastrarem. O ponto é o dinheiro e os bens que
Silas parece ter de acordo com a Revista Forbes que o colocou como um
dos pastores mais ricos do Brasil.
Há certas ideias prontas quando
conversamos sobre as religiões evangélicas como a de que todo fiel é um
idiota disposto a pagar quantias grandes e ser enganado. O pressuposto
dessa ideia é de que a prosperidade que o fiel deseja não tem nenhuma
relação com a entrega mensal de dinheiro para um pastor ou igreja. Deste
modo, há extorsão. Há má fé dos pastores que são gananciosos e
inescrupulosos que abusam de pessoas pobres e ignorantes que desejam ser
enganadas. Sim, este é um tipo de raciocínio que se faz quase
automaticamente nos dias de hoje, mas precisamos pensar sobre isso.
Atualmente, não consigo ver algo mais
valoroso do que o dinheiro. Vemos todos os dias pessoas morrerem por ele
ao reagirem à assaltos por exemplo, coisa que não víamos de maneira tão
frequente. Além do valor em termos de moeda de troca e de ser
fundamental para a existência material do ser humano, ele é amplamente
investido de valores simbólicos bastante importantes. Como por exemplo, o
dinheiro traz o sentimento (ou fantasias) de potência. Se você ganhasse
na loteria PODERIA fazer tudo aquilo que deseja hoje mas não faz porque
não o tem em grande quantidade. Com o dinheiro você pode! E os limites
de sua atuação ficam largos e quase infinitos. Essa é uma fantasia muito
comum.
Não duvido que o fiel que dá seu
dinheiro para a igreja tenha retorno e muitos benefícios, pois o ato de
dar o dinheiro em função de uma promessa de prosperidade é algo poderoso
e utiliza de altas tecnologias existentes em nosso próprio sistema
nervoso. Ou seja, existem capacidades cerebrais latentes, muitas vezes
adormecidas, que são despertadas de maneira regrada, padronizada e
disciplinada pelos sistemas religiosos. A ideia de Deus oferece o amparo
necessário ao inicio de um processo de se desejar algo sem culpa e sem
medo permitindo ao sujeito acreditar que pode ter um projeto de vida e
que tem um poder espetacular (essa também é a função da educação e do
exercício dos diversos tipos de habilidades cognitivas, em um sentido
mais amplo). Mas é necessário que se acredite que Deus seja de fato um
“Ser”, algo extracorpóreo e muito poderoso. É necessário que isso não
seja uma ilusão e sim uma realidade praticada todos os dias por meio de
rezas cultos e com a marca concreta do sacrifício financeiro.
Outro ponto interessante foi a função
social que a igreja cumpre em "retirar" pessoas das drogas e a
homossexualidade. Nesse ponto Silas fica extremamente enérgico. Chama-me
atenção um cenário colocado por ele de que, se aprovada a lei anti
homofobia, ele não poderá chamar atenção de gays que porventura lascarem
beijos em seus cultos, porque eles estão protegido contra qualquer tipo
de apreensão ou puxão de orelha. Nesse ponto Silas Malafaia, que,
repito, é um sujeito inteligente, abandona qualquer razão, pois, não se
trata de privilégios e sim garantia de direitos civis. Simples assim.
Ele menciona também que Freud “re-orientou” uma paciente homossexual mas
se esquece de que o pensamento freudiano foi muito além disso e
radicalizou a ideia que temos de religião, sexualidade e felicidade (ou
prosperidade).
Marília Gabriela fez bem seu papel. O
que sobra de tudo isso é que todos os humanos, que acreditam ou não em
Deus, estão no mesmo barco. Um barco que certamente vai afundar, cujos
salva vidas são nossas meia dúzia de ilusões.
Psicanalista mestre em psicobiologia
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