A gente se vai e fica tudo aí, os planos a longo prazo e as tarefas de casa, as dívidas com o banco, as parcelas do carro novo que a gente comprou pra ter
status.
A gente se vai sem sequer guardar as comidas na geladeira, tudo apodrece, a roupa fica no varal.
A gente se vai, se dissolve e some toda a importância que
pensávamos que tínhamos, a vida continua, as pessoas superam e seguem suas rotinas
normalmente.
A gente se vai e todos os grandes problemas que achávamos
que tínhamos se transformam em um imenso vazio, não existem problemas.
Os problemas moram dentro de nós. As coisas têm a energia que colocamos nelas e exercem em nós
a influência que permitimos.
A gente se vai e o mundo continua caótico, como se a nossa
presença ou ausência não fizesse a menor diferença. Na verdade, não faz. Somos pequenos, porém, prepotentes. Vivemos nos esquecendo
de que a morte anda sempre à espreita.
A gente se vai, pois é. É bem assim: Piscou, se foi. O cachorro é doado e se apega aos novos donos.
Os viúvos se casam novamente, fazem sexo, andam de mãos
dadas e vão ao cinema.
A gente se vai e somos rapidamente substituídos no cargo que
ocupávamos na empresa.
As coisas que sequer emprestávamos são doadas, algumas
jogadas fora.
Quando menos se espera, a gente se vai. Aliás, quem espera ir assim? Se a gente esperasse pela morte, talvez a gente vivesse
melhor.
Talvez a gente colocasse nossa melhor roupa hoje, fizesse
amor hoje, talvez a gente comesse a sobremesa antes do almoço.
Talvez a gente esperasse menos dos outros, se a gente esperasse pela morte, talvez a gente perdoasse
mais, risse mais, saísse a tarde para ver o mar, talvez a gente quisesse mais
tempo e menos dinheiro.
Quem sabe, a gente entendesse que não vale a pena se
entristecer com as coisas banais, ouvisse mais música e dançasse mesmo sem saber.
O tempo voa.
A partir do momento que a gente nasce,
começa a viagem veloz com destino ao fim - e ainda há
aqueles que vivem com pressa!
Sem se dar o presente de reparar que cada dia a mais é um
dia a menos, porque a gente se vai o tempo todo, aos poucos e um pouco mais a
cada segundo que passa.